70 anos de missão evangelizadora vocacional [1]

 

Acabou a II Grande Guerra Mundial (07/05/1945). Foi criada a Organização das Nações Unidas (24/10/1945). A velha monarquia italiana dos reinos unificados cedeu lugar a República (02/06/1946). É tempo de reconstrução, hora da esperança… dias melhores virão. A Itália experimenta o “milagre econômico”. A Congregação dos Rogacionistas está em expansão. A Cúria Geral foi transferida de Messina para Roma e instalada na Rua Varallo, atual “Via dei Rogazionisti”, no dia 14 de dezembro de 1947. A atual sede da Cúria foi inaugurada em janeiro de 1964. É tempo de mudanças, avanços… missão que continua e nunca termina.

 

Pe. Redento Levi, natural de Nápoles, que entrou na Congregação ainda adolescente a convite do próprio Fundador, acabava de regressar dos Estados Unidos onde angariou fundos para a construção da Igreja de Santo Antônio, situada na Praça Asti, ao lado da nova Cúria Geral.

 

Em 1949, o Pe. Redento se preparava para viajar a Argentina, com uma passagem generosamente prometida pelo embaixador daquele país, em vista de uma possível fundação. Mas o religioso veio improvisamente a falecer no dia 4 de novembro deste mesmo ano, às vésperas de viajar àquela nação a convite de D. Leopoldo Buteler, Bispo de Rio Quarto, na Província de Córdoba. D. Leopoldo, primeiro Bispo desta jovem diocese, erigida no dia 20 de abril de 1934, pelo Papa Pio XI, oferecia uma paróquia aos Rogacionistas.

 

Missão além-fronteiras

O Governo Geral da Congregação estava decidido a abrir a primeira frente missionária além-fronteiras. Se a morte do Pe. Redento interrompeu os planos de uma possível fundação na Argentina, chegava uma solicitação do Bispo, D. Hugo Bressane de Araújo, da diocese de Guaxupé, Estado de Minas Gerais, Brasil. D. Hugo oferecia aos Rogacionistas um Orfanato, com “artes e ofícios, convenientemente equipados,” na cidade de Passos, que na época contava com uma população de aproximadamente 30 mil habitantes.

 

Apenas sete meses após a morte repentina do Pe. Redento, no domingo de Pentecostes, dia 28 de maio do Ano Santo de 1950, quando a Igreja celebrava a chegada do Espírito Santo que empurrou os discípulos de Jesus para missão, o Superior Geral, Pe. Teodoro Tusino, comunicava a todos, com grande alegria e esperança, a notícia da abertura de uma nova obra da Congregação, a primeira fora da “pátria mãe”. Era a resposta corajosa desta família religiosa aos apelos da Igreja e ao convite de D. Hugo.

 

Pe. Tusino, ao comunicar a notícia aos coirmãos, manifesta a esperança de ver as obras Rogacionistas prosperarem no Brasil e se espalharem por toda a América Latina. Começava agora o processo de escolha dos primeiros missionários chamados a semear o carisma do Rogate nas terras do “novo mundo”. Com entusiasmo e alegria escrevia o Superior Geral: “É necessário, então, pensar no pessoal a ser destinado à nova casa. Trata-se da longínqua América. Tão longe, e quem vai para lá não pode pensar num retorno, num curto ou longo tempo. Deverá acostumar-se a um ambiente novo, aprender novo idioma…”

 

O Espírito empurra para a missão

Passado apenas 5 meses, em 18 de outubro de 1950, Jubileu do “grande regresso e do grande perdão,” e a poucas semanas da declaração do Dogma da Assunção de Nossa Senhora pelo Papa Pio XII, decretado no dia 1 de novembro daquele ano, os primeiros missionários Rogacionistas, vindos da Itália, chegaram à cidade de Passos. Os 4 pioneiros na missão – Pe. Mário Labarbuta, Pe. José Lagati, Pe. Onofrio Scifo e Ir. Antonino Adamo – tiveram a coragem de deixar as terras italianas, enfrentar quase duas semanas no navio Anna Costa, que partiu do porto de Genova para desembarcar em Santos e seguir, via Guaxupé, sede da diocese, para a cidade de Passos onde foram acolhidos na estação ferroviária pelo Monsenhor Messias Bragança, pelo prefeito da cidade, Sr. Geraldo da Silva Maia, outros sacerdotes e centenas de pessoas.

 

Depois de um jantar oferecido aos missionários na casa do Monsenhor Messias, os padres finalmente chegaram ao Educandário Senhor Bom Jesus dos Passos. Era meia-noite e meia do dia 18 de outubro de 1950. Por feliz coincidência, nesta data celebra-se a Festa de São Lucas, um dos evangelistas do Rogate (cf. Lc 10,2). Dois meses depois, no natal daquele ano, os Rogacionistas acolheram no Educandário as primeiras crianças. Começava a missão dos Rogacionistas na América Latina.

 

Ainda no clima da celebração do primeiro centenário do nascimento do nosso Fundador, e logo depois da instalação dos primeiros missionários Rogacionistas em Passos, onde os religiosos chegaram e encontraram a estrutura pronta, foi aberta uma segunda casa no Brasil. Desta vez na cidade de Bauru-SP, que no dia 16 de setembro de 1951 acolheu solenemente os 4 novos missionários italianos: Pe. Antônio Indelicato, Pe. Paulo Petruzzellis, Pe. Antônio Patavino e o Ir. Rosário Caravello.

 

Em 1954, apenas dois anos depois da fundação em Bauru, na cidade de Criciúma-SC, na região sul do país marcada pela forte presença dos imigrantes italianos, foi aberta a terceira casa Rogacionista no Brasil. A obra em Criciúma, que inicialmente compreendia apenas o “Bairro da Juventude” foi iniciada com a colaboração dos Padres das comunidades de Passos e Bauru, que receberam da Itália mais dois religiosos: Ir. Antônio Lanza e Ir. Rocco Musarra.

 

Após a inauguração das duas casas com trabalhos socioeducativos – Passos e Bauru – a meta era uma terceira casa em uma região propícia à abertura daquele que seria o primeiro seminário Rogacionista fora da Itália. Havia a possibilidade de uma fundação em Diamantina-MG, mas o sul do país era considerado um celeiro de vocações. Assim foi criado no dia 19 de julho de 1959, ao lado do “Bairro da Juventude”, o Seminário Rogacionista Pio XII, e, anos mais tarde, foi aberto o Seminário João XXIII em Bauru. Recorda-se que em Agudos, próximo de Bauru, havia um enorme seminário Franciscano. Em Forquilhinha, cidade vizinha de Criciúma, também tinha uma casa Franciscana. Não é difícil imaginar a influência Franciscana na escolha por uma casa de formação em Criciúma. Observa-se também o esforço de inculturação e a sensibilidade dos missionários que estendiam a presença carismática no Brasil no campo da evangelização, do serviço socioeducativo, a oração e a promoção das vocações. O Seminário de Passos, o qual já ofereceu à Congregação numerosas vocações, por motivos que devemos aprofundar foi aberto no dia 1 de fevereiro de 1980, 30 anos depois da chegada dos primeiros missionários naquela cidade.

 

Hoje, a Congregação encontra-se espalhada por vários Estados do Brasil e presente no Paraguai e na Argentina e em outros 24 países nos cinco continentes. Os Rogacionistas continuam a missão de rezar pelas vocações, propagar esse espírito de oração e de ser bons operários na messe do Senhor no atendimento aos mais necessitados, especialmente aos jovens e as crianças pobres. O Rogate se faz realidade nas atividades de evangelização, no serviço socioeducativo, na comunicação social, na formação da juventude e no serviço de animação vocacional e seminários. Desta maneira, o sonho de Santo Aníbal, o Rogate – seu carisma missionário, propagou-se por todo o mundo.

 

Por que começar a missão rogacionista na América Latina? Por que o Brasil?

Atualmente somos quase 600 religiosos espalhados por todos os continentes. Naturalmente, faz-se uma pergunta: Por que os Rogacionistas escolheram de iniciar a missão fora da Itália em terras latino-americanas e mais precisamente no Brasil?

 

Certamente a escolha de um país sul-americano, a quase abertura na Argentina, atravancada no último momento por causa da morte do missionário, Pe. Redento, e a abertura no Brasil, seguiram alguns critérios que determinaram tal opção. América Latina é um continente de raízes católicas, e o Brasil, bem como a Argentina, acolheu milhares de imigrantes italianos além de ser uma nação com boa estabilidade política no período pós-guerra, quando a democracia brasileira tentava se firmar sobre a liderança do Presidente Getúlio Vargas. Recorda-se que nas Congregações havia uma certa preocupação com os regimes totalitários na Europa.

 

Fica evidente, que no final da agitada década de quarenta, os Superiores estavam realmente decididos a abrirem não apenas a primeira casa Rogacionista fora da Itália, mas algumas comunidades em um mesmo país, preferencialmente no continente Sul-americano. Observa-se que o espaço de tempo entre a morte do Pe. Redento, que deveria visitar a diocese de Rio Quarto, na Argentina, e a abertura da casa de Passos, temos um intervalo de apenas 11 meses. Curto também é o espaço de tempo entre a abertura da casa de Passos e aquela de Bauru em 1951. Nota-se que em menos de um ano (outubro de 1950 – setembro de 1951), a Congregação que na época contava com aproximadamente 160 religiosos, enviou 8 missionários ao Brasil.

 

A Província Rogacionista São Lucas

No dia 18 de outubro de 1986, o Superior Geral, Pe. Pietro Cifuni, constituiu a Província Rogacionista São Lucas com sede em São Paulo-SP. Atualmente a Província, que já celebrou 10 capítulos provinciais, conta com doze comunidades no Brasil (Bauru, Brasília, Criciúma, Curitiba, Gravataí, Passos, Presidente Jânio Quadros, Queimadas, São Paulo e Vitorino Freire), três na Argentina (Campana, Córdoba e Tucumán), uma no Paraguai (San Lorenzo) e outra em Angola (Cuango). A Província tem hoje 61 sacerdotes, 10 religiosos estudantes e 2 noviços.

 

O milagre em Passos e a beatificação de Pe. Aníbal

No dia 7 de outubro de 1992, o saudoso Papa São João Paulo II, beatificou o Fundador graças ao milagre de cura da adolescente Gleida Danese, que nasceu no dia 26 de janeiro de 1976, na mesma cidade que acolheu os primeiros missionários Rogacionistas. Na Santa Casa de Misericórdia de Passos, onde a pequena Gleida enfrentava uma gravíssima crise de saúde com a ruptura traumática da aorta, em combinação com a síndrome de Guillain-Barré, anemia pós-hemorrágica e choque hipo-volênico, Deus atendia as preces da Sra. Maria Aparecida Amparado Danese, avó paterna de Gleida, que na capela do Educandário (atual Santuário Santo Aníbal), suplicava, por intercessão de Pe. Aníbal, a cura de sua neta, adotada aos sete meses de vida pelo seu filho, Dr. Marcílio Antônio Danese, médico pediatra e sua esposa, Sra. Maria Célia Ferreira, professora.

 

É no mínimo intrigante o fato do milagre que culminou com a beatificação de Pe. Aníbal acontecesse exatamente na mesma cidade que acolheu os primeiros missionários Rogacionistas. Não faltou quem afirmasse que a cura de Gleida era um sinal de reconhecimento do Fundador que agradecia a cidade de Passos e a todos os brasileiros pela generosa acolhida aos Rogacionistas.

 

Neste ano celebramos os 70 anos da chegada dos primeiros missionários Rogacionistas ao Brasil e a fundação da casa de Passos. Com gratidão fazemos memória desta história que continua dando muitos frutos à Congregação e à Igreja na sua missão evangelizadora e sempre vocacional. No caminho encontramos uma multidão de amigos que nos acolheram, ajudaram de diferentes maneiras e com eles partilhamos nossa espiritualidade e carisma. Hoje, vemos espalhada por todo o mundo, a Família Carismática do Rogate, composta por sacerdotes, religiosos e religiosas, cristãos leigos e leigas. Todos, operários e operárias na messe do Senhor… discípulos missionários do Cristo do Rogate. Com Santo Aníbal rezamos: Enviai, Senhor, operários e operárias à vossa messe. Amém.

 

[1] Sacerdote Rogacionista, natural de Passos-MG, Brasil. Atualmente é Conselheiro Geral da Congregação para o Setor do Laicato, Paróquias e Pastoral da Juventude. Todas as informações contidas neste artigo foram colhidas nos “Bollettino” da Congregação, um órgão oficial de comunicação interna dos Rogacionistas.