Um hebreu, chamado Jesus, proveniente de Nazaré, Israel, uma faixa de terra de 120 km por 60 km ocupada pelos romanos, viveu em Cafarnaum, próximo ao logo da Galileia. Ele foi crucificado na vigília da Páscoa, numa sexta-feira, dia 7 de abril do ano 30. A aristocracia do templo o condenou à morte por blasfêmia e o poder político imperial considerou nocivo ao bem comum.

 

No tempo de Jesus a Palestina experimentava uma relativa calma. Segundo o historiador Tácito, embora houvesse uma grande expectativa messiânica, no período de Tibério César, imperador romano do ano 14 d.C. ao 37 d.C., e de Pôncio Pilatos, governador da Judeia entre os anos 26 d.C. ao 36 d. C., a situação era pacifica com poucos incidentes.

 

Jesus começou a sua pregação por volta do ano 28, mais de duas décadas após a revolta de Judas, o Galileu e muitos anos antes da guerra dos Judeus contra os romanos por volta dos anos 70. Antes de Jesus iniciar a sua vida pública temos o movimento de João Batista, que se retirou no deserto da Judeia e começou a pregar o juízo eminente de Deus sobre Israel e a necessidade de preparar-se mediante um batismo no rio Jordão.

 

O movimento de João, o Batista

O movimento de João Batista teve grande repercussão e levou Herodes Antipas, Tetrarcada da Galileia e da Pereia, a condená-lo à morte. Para os evangelistas, João Batista foi o precursor de Jesus e não faltou certa polêmica entre os seus discípulos e aqueles do Batista. De qualquer maneira João criou e liderou um dos mais significativos grupos do judaísmo da época e entre os muitos que foram batizados por ele às margens do Jordão, encontramos um jovem chamado Jesus (Mc 3,14).

 

Se no evangelho de Marcos vemos João Batista apresentar alguma dificuldade para batizar Jesus, no quarto evangelho temos uma clara notícia de colaboração entre Jesus e João Batista (Jo 3, 22-30; 4,1-2). De qualquer maneira Jesus começou o seu ministério depois que o Batista foi preso (Mc 1,14-15). Em Lucas encontramos a narrativa do nascimento de João Batista na Judeia, filho do idoso casal, o sacerdote Zacarias e sua esposa Isabel (Lc 1).

 

Jesus, o pregador itinerante

Nos evangelhos Jesus aparece como um pregador itinerante. Ele não foi um monge essênio, um fariseu dissidente e tampouco rabino de uma determinada escola. Os evangelistas divergem sobre os lugares e a duração do seu ministério itinerante que varia de um a três anos. Segundo Bento XVI, Jesus se identificava apenas com duas categorias de pessoas: os perseguidos e os pobres (At 9,4; Mt 25).

 

Além de pregador itinerante, ele realizava muitas curas e prodígios apesar das narrativas evangélicas sobre os milagres serem discutidas do ponto de vista histórico, sua natureza e significado. De qualquer modo os evangelistas enfatizam o ministério de Jesus “que foi um profeta poderoso em obras e palavras diante de Deus e de todo o povo” (Lc 24,19). Flávio Josefo, historiador da época, menciona Jesus como um “artífice de obras extraordinárias” (Antiguidades Judaicas, XVIII, 63) e mais tarde, Celso, filósofo grego do segundo século, recordará Jesus como um grande mago capaz de realizar muitos milagres (Mc 1,32-34; Lc 13,32).

 

De acordo com os evangelhos, inclusive os apócrifos, Jesus foi um pregador, taumaturgo e exorcista. Mas o principal título dado a Jesus pelos evangelhos é de Filho de Deus, o “Verbo” feito carne, o Messias – o Cristo (Mc 1,1; 8,29; 14,62; 15,39; Jo 1,14; 4,19.26). O tema central de sua pregação era a chegada do Reino de Deus não apenas para o povo de Israel, mas para toda a humanidade. Todavia, é importante observar que Jesus não compreende o Reino como um estado teocrático ou um sistema político, mas como o dom da salvação de Deus para todo o povo. O Mestre distingue o que é de César daquilo que é de Deus a quem ele chama de Pai, Pai nosso (Mt 22,15-22; Lc 11,1-4).

 

Os privilegiados do Reino

Os pobres foram os principais destinatários da Boa Nova de Jesus que ensinava com autoridade (Mt 7,29). Pobres não apenas no sentido religioso ou espiritual, mas também no aspecto sociológico e material. Jesus não anunciava o Reino como algo para o futuro, mas como uma realidade já presente que se manifestava nas curas, nos milagres e nos exorcismos. No evangelho os pobres e os pecadores são os privilegiados do Reino. Logo a ideia dos Saduceus e Fariseus, defensores das tradições e das leis, entrou em crise diante da mensagem de Jesus (Mt 5,3).

 

Na vida pública, Jesus desenvolveu uma atividade didática explicando a Lei de Moisés como autêntico Mestre de Israel. Segundo os seus contemporâneos ele é o mestre e seus seguidores são discípulos chamados a segui-lo. Mas a diferença dos demais mestres com suas respectivas escolas, os discípulos de Jesus não se dedicam a estudar a Lei. Eles devem aderir à pessoa do Mestre e serão discípulos para sempre, itinerantes e missionários.

 

Enquanto judeu, Jesus participou do serviço litúrgico nas sinagogas aos sábados e aproveitava a ocasião para ensinar e debater com os doutores da Lei mosaica. Ele teve calorosas controvérsias com os fariseus e os escribas ao interpretar a Lei e as prescrições rituais (Mt 5,21-48; Mc 2,27; 7,15). Jesus propõe um novo mandamento: o amor incondicional a Deus e ao próximo.

 

No caminho para Jerusalém, capital do judaísmo, Jesus prepara os discípulos para o seu destino de morte violenta (Mc 8,31; 9,31; 10,33). Na última ceia ele prevê o seu “fracasso” e convida os discípulos a reconhecerem o iminente sofrimento como parte de sua missão terrena e cumprimento da vontade do Pai. No Getsêmani, enquanto Jesus rezava e transpirava sangue – “Pai, se quiseres, afasta de mim este cálice; contudo, não seja feita a minha vontade, mas a tua” – os discípulos dormiam (Lc 22,39-46).

 

A experiência pascal

A pregação de Jesus despertou uma grande esperança nos discípulos e em todos que acolheram a sua mensagem. Depois de sua morte, por motivos políticos e religiosos, fato historicamente incontestável, temos o encontro com o Ressuscitado (30 d.C.). Nota-se que a tragédia do Calvário foi para os discípulos uma grande decepção (Lc 24,21). De fato a ideia de um Messias sofredor era estranha para a mentalidade judaica. Estava claro que Jesus não era o Messias esperado por Israel.

 

Após a páscoa os discípulos experimentaram alguns eventos extraordinários denominados como: “as aparições do Senhor.” A fórmula mais antiga desta experiência nos foi transmitida por Paulo de Tarso, um judeu da diáspora, convertido à fé cristã por volta do ano 33. Na carta à comunidade de Corinto ele afirma: “Cristo morreu por nossos pecados… e ao terceiro dia foi ressuscitado…” (1Cor 15,3-9). Segundo os seus discípulos Jesus voltou a viver com uma nova forma de existência, isto é, não segundo a “carne”, mas no “espírito.” Significa que o Profeta da Galileia, da estirpe de Davi, foi verdadeiramente constituído Filho de Deus (Rm 1,3-4).

 

Pedro foi incisivo no seu discurso aos judeus em Jerusalém: “Esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o constituiu Senhor e Cristo” (At 2,36). Reunidos em Jerusalém, na manhã da festa de Pentecostes, os Apóstolos começaram a dar vida ao embrião da Igreja, o novo Israel. Começava a missão, de modo particular dos Doze, levada adiante pela pequena comunidade que foi se distanciando do judaísmo e espalhando-se “até os confins da terra” (At 1,8). Assim começou a história da comunidade dos seguidores de Jesus, que na cidade de Antioquia, pela primeira vez, foram chamados de “cristãos” (At 11,26).

 

No segundo século a ruptura dos seguidores de Jesus com o judaísmo estava consumada. Os cristãos aboliram a páscoa judaica e celebravam a Páscoa do Senhor. A circuncisão e o sábado foram substituídos pelo Domingo – O Dia do Senhor – e o Batismo. A Igreja, compreendida como o novo Israel, interpretava as Antigas Escrituras à luz de Cristo. Os cristãos espalharam pelo mundo a fé no Ressuscitado. Ele, Jesus, é “o Cristo, o Filho de Deus vivo,” como respondeu Pedro (Mt 16,16). Avançava o processo de “catolicização” do cristianismo. Amém.

 

Bibliografia minima

GEORGE, A. – GRELOT, P., Introduzione al Nuovo Testamento, Borla, Roma, 1977-1980 (5 vol).

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JOSSA, Giorgio, Il Cristianesimo antico, Dalle origini al Concilio di Nicea, Carocci editore, Roma, 2017.

Meier, J., Un ebreo marginale : ripensare il Gesù storico, Brescia, Queriniana, 2003.

PINCHERLE, A., Introduzione al cristianesimo antico, Laterza, Bari, 1971.

THEISSEN, G., Sociologia do movimento de Jesus, Vozes, Petrópolis, 1989.